terça-feira, 15 de julho de 2014

Sobre o Hamas e o PSOL

O PSOL - "Partido Socialismo e Liberdade" - é um dos mais curiosos frutos do pensamento esquerdista. Um leitor desatento poderia ser convencido de que a agremiação verdadeiramente se preocupa com os direitos dos gays - ou de qualquer minoria ou grupo perseguido que seja, como supostamente o são as mulheres -, se esse leitor  não se desse a um mínimo de esforço para conhecer o que a legenda realmente defende. Como todo bom partido marxista moderno, o PSOL é oficialmente apologista do leninismo. Mal sabem os eleitores da beautiful people universitária que Vladimir Lenin defendia o extermínio de minorias étnicas e o aprisionamento de crianças, como extensivamente discutido pelo general-coronel do exército vermelho Dmitri Volkogonov. A militância não sabe o que o partido é, ou o que querem dizer suas palavras de ordem, como sugere o texto publicado na página oficial da organização, "Em Defesa do Leninismo". O texto, aliás, também defende outra das vacas sagradas dos psolistas, o senhor Leon Trotsky, líder militar da revolução de outubro que solicitou ao partido bolchevique a criação dos campos de concentração para conter a onda de "inimigos do povo", "encontrados" durante o primeiro Grande Terror soviético - e não há que se falar em "stalinismo": Dzerzhinski foi da prole de Ilich, não de Vissarionovich; foi o criador da estrutura de poder que apenas seria reutilizada pelo ditador georgiano. O mesmo PSOL que louva os idealizadores do Gulag, do Terror e da repressão étnica levada a cabo pela polícia política socialista, defende o Hamas - e pelas melhores razões. O PSOL, no cerne das convicções de cada militante, está disposto às mesmas coisas que o Hamas em nome do poder, a ser usurpado para a causa da "justiça social" - naturalmente, sob a mão de ferro do partido (ou, no caso do Hamas, da teocracia islâmica, que tem sua própria versão do discurso "em nome dos pobres").
Imagem: http://goo.gl/tQ0ztb

O Hamas é uma organização antissemita por excelência - até em seu estatuto, a organização faz defesa do genocídio contra o povo judeu. Esta não é a opinião de um autor conservador: esta é uma diretriz registrada em documento oficial da organização. Conforme os próprios integrantes da "resistência palestina", seu objetivo é "matar os judeus", "combater os judeus", "matá-los mesmo que se escondam atrás de rochas e árvores". O Hezbollah, outra organização para a "libertação" palestina, é bem mais explícito, e não tem medo de divulgar fotos de seus militantes fazendo a saudação nazista. Quando o PSOL brasileiro queima a bandeira israelense - para ser mais específico, quando o candidato Babá, apoiado por Marcelo Freixo, faz esta afronta ao símbolo de um povo perseguido em todo o mundo há milênios - em praça pública, proclamando apoio incondicional aos integrantes de movimentos como o Hamas, está apenas "voltando às origens". O ídolo Lenin jogou mulheres, crianças e idosos nos campos de concentração: os alunos do maior líder marxista do século XX podem apenas seguir o exemplo, e vão bater palmas para quem pede o extermínio do povo judaico. O partido brasileiro possui um vínculo ideológico imortal com as organizações muçulmanas, que é precisamente o que torna os movimentos revolucionários de todos os países essencialmente iguais: esses grupos têm por objetivo alcançar o "fim das desigualdades", ou o "fim da opressão imperialista" através do assassinato de indivíduos que entendem como "inimigos", os quais podem definidos por sua classe, raça, religião ou afiliação política. Essa crença em um "futuro perfeito", com uma organização social ideal, deve, para cada um dos integrantes do partido revolucionário ser trazida à realidade por meio de um "julgamento", que irá acabar com as malignas formas de vida responsáveis por impedir o nascimento do novo Éden. Essa maneira de compreender a realidade é a essência do pensamento revolucionário: é o núcleo da ideia marxista - contra a "burguesia" ou contra o "Völkerabfälle" -, da ideia nacional-socialista - contra as chamadas "raças inferiores" - e do islam político - contra os "kefr", sejam eles judeus ou cristãos.

Ainda que o movimento marxista brasileiro e o movimento islamista - no sentido correto do termo - possuam um "núcleo" idêntico, há diferenças importantíssimas em seu discurso "para fora", assim como em outros aspectos que fundamentam as duas ideologias - aqui, mais uma vez, em um sentido preciso do termo, especificamente, o criado por Voegelin. O PSOL, como bom partido revolucionário, interpreta o papel de defensor dos homossexuais, ao mesmo tempo em que aplaude, em seus veículos de comunicação oficiais, regimes responsáveis pela perseguição e assassinato desse grupo de pessoas. Os islamistas defendem a execução dos "sex-libers". O PSOL apenas defende as minorias - todas elas, enquanto for politicamente favorável ao movimento socialista: o objetivo derradeiro é a tomada do poder, mesmo que pela insurreição (como Lenin, aliás, sugeria que fosse feito). Se a minoria em questão passa a ser identificada como "inimiga" (como agora o partido vê os judeus), então o aparato é incitado à agitação racista, e está disposto a deitar-se mesmo com o fascismo islâmico. Os maometanos da escola de Muhammad Kutb, por sua vez, são diferentes em discurso e fundamento por uma razão genética, que é exatamente sua força, e o que os torna os vencedores finais sobre todas as outras correntes de pensamento revolucionário. O alicerce "civilizacional" dessa vertente das ideologias (ainda conforme Voegelin) é a revelação corânica.

Enquanto a vasta maioria das ideologias teve morte rápida, o islamismo é imortal - ou quase. A revolução francesa durou poucas décadas, e nada sobrou de Robespierre. O movimento apagou-se, e ninguém se importa com Rousseau a ponto de fazê-lo profeta da religião de Estado, como fizeram os líderes responsáveis pela primeira Grande Revolução bem-sucedida. Lenin deixou uma mixórdia confusa de criaturas que variam do Juche ao Socialismo Africano Somali e Etíope. Nenhuma versão reelaborada de seu pensamento durou mais de um século: todas, sem excessão, renderam-se em maior ou menor grau à economia de mercado (até a Coreia do Norte tem suas ZEEs). Todas fracassaram miseravelmente em criar um legado para além do desastre social e da fome, que é facilmente identificada a única constante dos Estados marxistas. O nacional-socialismo hitlerista durou pouco mais de uma década, e a miséria humana criada por ele (mesmo contra os alemães, diga-se de passagem) não têm comparação com quaisquer catástrofes ocorridas antes na história humana, salvo a fome ucraniana - não por coincidência, os únicos genocídios de escala e rapidez próximas às do legado germânico são o Holodomor e a Grande Fome chinesa, de Mao Zedong. O bolivarianismo latino-americano é uma piada mesmo para os padrões do fracasso das demais ideologias - nasceu morto, deformado, aleijado e inspirado em um ditador cínico e racista que odiava a América Latina, o próprio Bolívar. Seu resultado é o colapso das economias regionais e o ódio popular sem fim contra as lideranças, que são débeis em demasia para repetir as conquistas de seus ícones do início do século XX. O islam político nunca teve um fracasso tão miserável quanto seus "irmãos", porque sua base é a própria civilização islâmica. O islamismo não promete um paraíso terrestre inalcançável, nunca visto por olhos humanos - o islamismo sugere apenas o que (nas cabeças dos clérigos islâmicos) existiu sob Muhammad. Todas as "sociedades vindouras" das outras ideologias são artificiais. O porvir do Hamas, para infelicidade da raça humana, é muito tangível, próximo, real.

O islam político nunca falou na "sociedade liberal e democrática" da Revolução Francesa. Nunca ofereceu "Liberdade, Igualdade e Fraternidade" em troca de alguns milhares de "inimigos do povo" decapitados. Jamais sugeriu o paraíso de justiça, liberdade e abundância para todos da economia comunista vindoura, que naturalmente exige alguns milhões de burgueses e "inimigos de classe" enviados para as covas coletivas. Nem sequer cogitou algum "socialismo étnico" a ser criado sobre as cinzas dos "Untermenschen". O islam de Kutb, do Hamas e do Hezbollah quer a sociedade em que Muhammad viveu: quer pura e simplesmente o domínio completo de sua religião, expansionista, implacável, com a única certeza de oferecer o fio da cimitarra para as cabeças de quem se recusa a submeter-se. O islam político vê o inferno como paraíso, e é exatamente por isso que ele tem mais força: sua promessa é mais fácil de cumprir. Essa ideologia enxerga a própria civilização islâmica como o futuro, e seu apelo é óbvio, para quem segue a fé. É por essa razão que, no fim, o Hamas engolirá o PSOL.

O PSOL, assim como todos os demais partidos marxistas das Américas, é como um sopro, fadado a se dissipar, como fizeram seus irmãos durante as últimas décadas. Nunca houve, nem haverá, civilização fundada pelo marxismo. A religião voltou com força à China, assim como ao Leste Europeu, e as economias planificadas desfizeram-se como castelos de cartas. O PSOL morrerá como seus antecessores, mas de forma mais trágica - e irônica. Seus protegidos herdarão o mundo, e não terão qualquer misericórdia para aqueles que os socialistas dizem representar, ou mesmos para os próprios socialistas. Em mais de um milênio de expansão ininterrupta, o Islam varreu inúmeras culturas da existência, e não teve qualquer gesto de benevolência para o ateísmo. Os mesmos socialistas que pedem o fim de Israel pelas mãos da "resistência" muçulmana verão suas últimas horas diante de um tribunal da Shariah. Não há "oposição" ou propaganda anti-clerical sob a lei corânica - há apenas a submissão, a Shahada ou a morte.

sábado, 14 de junho de 2014

O calcanhar de aquiles do conservadorismo brasileiro

Parada militar soviética: a URSS forçava colegiais
a participarem de treinamento militar.
Imagem: Daily Motion
O movimento conservador do Brasil cresce vertiginosamente - o crescimento nas vendas de livros de autores identificados com a direita dá testemunho disso. Inúmeros autores se destacam - entre eles, com mais "eco" tanto nos meios "alternativos" quanto na grande mídia, estão nomes como Rodrigo Constantino, Olavo de Carvalho, Reinaldo Azevedo Leandro Narloch. Não há dúvida que boa parte dos escritores liberais ou conservadores possui melhor formação política ou intelectual que os autores de esquerda: é muito comum encontrar trotskistas que não fazem a menor ideia do que Leon Trotsky defendia, ou marxistas que não leram uma obra sequer de Karl Marx - com muita sorte, é possível se deparar com um sujeito que leu o "manifesto", ou alguém que tenha lido uma edição resumida da "Ideologia Alemã". Os escritores e militanes do campo conservador-liberal normalmente conhecem bem os autores do outro lado, isso quando não são verdadeiros especialistas em literatura dos "cânones" bolcheviques - Reinaldo Azevedo é um grande conhecedor da obra de Gramsci, e Olavo de Carvalho leu a maior parte da obra de Marx disponível em português (assim como da disponível em outros idiomas), de Gramsci e de Lenin, o que lhes dá grande vantagem. Os dois foram militantes "de carteirinha" de partidos comunistas - Reinaldo Azevedo foi ligado à representação da quarta internacional no Brasil, enquanto Olavo foi filiado ao antigo PCB (atual PPS). O grande problema do conservadorismo brasileiro não é o conhecimento dos clássicos adversários - o "movimento" (se é que merece este nome, como veremos a seguir) está muito bem servido neste aspecto. A fraqueza mortal da direita brasileira é a falta de organização.

Os partidos comunistas são conhecidos por sua disciplina. Na antiga União Soviética, ser membro do partido significava ter uma dedicação perene e férrea à causa. Quadros com as mais diversas funções eram preparados física e intelectualmente para situações críticas - mesmo indivíduos sem qualquer exposição a tarefas "braçais" deveriam passar por treinamento militar rigoroso. As atividades partidárias permeavam todos os aspectos da vida, passando pelas reuniões lúdicas juvenis até as associações de escritores. A militarização da sociedade não atingia apenas membros do partido: cidadãos comuns, "sem carteirinha", também eram submetidos a treinamento militar severo, desde os anos escolares. Alunos eram mandados às fazendas coletivas para o aprendizado das funções mais exigentes no plantio, turmas eram forçadas a receber treinamento com fuzis, incluindo desmontagem e tiro (este tipo de curso, aliás, foi retomado na Rússia de Putin, onde os jovens são levados a disputar pelos melhores tempos de montagem de fuzis da linha AK). Esperava-se de um indivíduo com a carteirinha do partido uma dedicação ainda maior à causa - maior ao partido de Lenin do que à sua própria família. A militância política brasileira "normal", por outro lado, é o retrato do descaso (salvo, evidentemente, a militância dos partidos comunistas, que sabe até mesmo neste país o que é o rigor).

Os comunistas do Brasil são forçados a pagar muito caro por uma carteirinha do partido. Há contribuições para todos os partidos, e as mais caras são conhecidas como o "PTízimo" - a contribuição mandatória dos militantes do Partido dos Trabalhadores. Em um partido comunista brasileiro, espera-se que os quadros compareçam rigorosamente a todas as reuniões e manifestações, com indumentária impecável. Todos batem continência para os chefes das nacionais, sem pestanejar. Estão todos em forma, como exército, para levar à cabo as ordens do centro. Os conservadores, por outro lado, são incapazes de doar um centavo sequer. Organizar um partido conservador no Brasil é tarefa hercúlea, porque cada militante está mais preocupado com o conforto de seu lar e em parecer mais importante do que em levar adiante os projetos do grupo. Não há disciplina, não há planos, não há partido que vingue. O máximo que se pode esperar de um conservador brasileiro é que organize um "encontro", no qual, quase com certeza, ao invés de resoluções, ordens e projetos, irão "acontecer" cervejas e difamação. O militante conservador deste país é muito hábil para discussões nas redes sociais, para virar copos e para sentir inveja das capacidades do vizinho, mas é mesquinho demais para abrir a carteira em nome da agremiação e tolo demais para perceber que é impotente quando sozinho. O soldado, quando em um exército disciplinado devidamente abastecido, pode ser uma força invencível. Quando sozinho, é, na melhor das hipóteses, um prisioneiro - na pior delas, um cadáver.

Com certeza o Brasil ainda verá grandes convulsões nos próximos anos, graças à ascensão conservadora em curso. Nomes irão brilhar e, muito provavelmente, vencer disputas eleitorais. Livros serão publicados, egos irão se encher como balões. Mas a vitória só será do conservadorismo brasileiro caso estes tolos que chamam a seus pares de "liberais", "libertarians" e "conservadores" aprendam a dar suor e lágrimas pelos seus movimentos. Uma das máximas mais importantes do grande estrategista que foi Napoleão Bonaparte é: "um exército precisa de três coisas: dinheiro, dinheiro e dinheiro". Ele estava certo, mas esqueceu-se de uma: disciplina. Com as festinhas e intrigas, os conservadores só conseguirão o deprezo do Brasil. Com disciplina militar e com força para sacrificar seus próprios recursos financeiros pela causa, os conservadores poderão conquistar este país. Só o futuro dirá qual dos objetivos o movimento vai escolher: o fracasso e a humilhação em nome do conforto ou a vitória a preço de sangue.

Treinamento de montagem de fuzil da linha Kalashnikov em escola no regime de Putin:


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O conceito de subversão, conforme Yuri Bezmenov

Karl Radek, líder bolchevique apoiador do sex-lib,
assassinado por Stalin
Imagem: https://goo.gl/KfJvNz
Ao longo da História da União Soviética, a mais eficaz forma de guerra não foi o uso de fuzis e tanques T-34. Enquanto a Rússia de então e o governo atual de Vladimir Putin fazem questão de mostrar o poder militar do regime, com os tradicionais desfiles na Praça Vermelha, o poderio bélico é apenas a última das ferramentas utilizadas na conquista de territórios. A tradição soviética mostra que a melhor forma de combate não exige o disparo de uma única bala - demanda apenas o uso eficaz da grande máquina de propaganda erguida pelo sistema socialista. Essa tática, o "vencer a guerra sem disparar um único tiro", se chama "subversão".

Yuri Bezmenov foi jornalista da agência estatal soviética "Novosti" (Notícias). Foi também membro da KGB, e trabalhou como agente de subversão na Índia e na própria União Soviética, onde sua tarefa era a de passar a melhor imagem possível do regime russo para personalidades estrangeiras em visita ao país. O agente conta que boa parte de seu trabalho consistia em levar os hóspedes "em tour" pelas cidades russas, muitas vezes induzindo-os a consumirem grandes quantidades de bebida alcoólica. Todo o processo visava tornar o visitante "o mais amaciado possível", deixá-lo mais propenso a levar a sério a propaganda oficial do governo soviético. Conforme Bezmenov explica, "a subversão consiste em fazer com que a vítima do processo abandone seus próprios valores, suas próprias crenças, e passe a adotar os valores, crenças e objetivos do grupo ou do país responsável pela ação subversiva". Ele explica que a subversão pode ser dividida em uma série de etapas, na aplicação "macrossocial" (aplicação ampla, com uso de meios de comunicação de massa) e na aplicação individual.

Contra os indivíduos, o processo é extremamente simples. Consiste em levar alguém a, em primeiro lugar, acessar a notícias que favoreçam apenas o ponto de vista do realizador do processo de subversão. O objeto do processo deve ser induzido, pelas informações oferecidas (sempre em viés parcial favorável ao ator), a negar as instituições de seu país ou religião, a entrar em postura de choque ideológico com as forças tradicionais de sua nação. Um cidadão americano, por exemplo, deveria ser exposto a informações que o levassem a desprezar as polícias e o exército de seu país. Um cristão deveria ser levado a acreditar que sua fé é errada, preconceituosa e maligna. Ao mesmo tempo, o objeto do processo deveria ser levado a admirar as instituições do ator do processo, até mesmo a desejar seu sistema político, econômico e moral. 

Na aplicação social, a subversão é dividida entre as seguintes etapas: desmoralização, desestabilização, crise e normalização. A primeira, a desmoralização, é a aplicação do processo individual visto anteriormente a toda uma sociedade. O processo envolve a utilização ampla dos meios de comunicação para construir estereótipos negativos associados ao sistema governamental da nação, despertar o desprezo pela fé tradicional do povo e causar ódio pelo modelo econômico adotado no país. Na primeira etapa da aplicação macrossocial, não há movimentos fortes de propaganda a favor do ator do processo, apenas o ataque aos sistemas de crenças dos sujeitos.

Na segunda etapa da aplicação macrossocial, o objetivo do ator é intensificar os conflitos já existentes dentro da sociedade. A nação que promove as iniciativas subversivas pode estimular grupos antissociais dentro do país à ação, como, por exemplo, estimular ações criminosas. Este modelo foi aplicado com sucesso na Rússia czarista, através da mobilização de grupos guerrilheiros, como o chefiado por Stalin (à serviço do partido bolchevique). Na China, a mesma coisa foi feita pelo Partido Comunista, através da comercialização de ópio - Mao tirou o sustento de toda a sua máquina partidária da droga, e efetivamente criou o modelo que serviria de inspiração para as FARC. Na fase de desestabilização, grupos que são contrários aos sistemas de valores do país também são levados à ação pelo ator, através até mesmo de financiamento direto, como, por exemplo, grupos ligados ao "sex-lib" (Karl Radek, um dos líderes do partido bolchevique, foi ele mesmo um grande expoente do "sex-lib" russo, e seria morto após a revolução a mando de Stalin, em um hospital psiquiátrico da URSS). A ação dos grupos financiados ou estimulados pelo ator do processo subversivo é criada para promover o surgimento da nova etapa da estratégia, que é a crise.

A crise consiste na completa degradação das relações sociais e em um processo de "militarização" da vida, ou de conflitos sistemáticos e sucessivos entre inúmeros grupos sociais. Nesta etapa da estratégia de subversão, quaquer tupo de entendimento pacífico dentro do país é impossível: todas as diferenças resultam em confrontação, por vezes violenta. A Rússia, mais uma vez, é um exemplo clássico: antes da Grande Revolução de Outubro, a movimentação frenética de grupos de assaltantes, traficantes de armas e terroristas levou a dezenas de mortes. Conflitos sangrentos foram registradas em inúmeras partes do país, e grandes "pogroms" levaram à morte muitas pessoas de ascendência judaica, que viram a grande perseguição promovida pelo regime se intensificar, em desajeitada resposta à atividade revolucionária. A população russa, em terrível sofrimento, viu operários serem fuzilados, levantes em diversas partes do país, assassinatos de funcionários do governo e o surgimento dos "sovietes", ou conselhos de deputados operários e soldados, que passaram a exercer uma administração informal sobre partes da sociedade russa, notoriamente o exército e os trabalhadores da cidade (principalmente). De acordo com Yuri Bezmenov, após a intensificação dos conflitos internos no objeto da subversão, o ator do processo tenta promover o surgimento dos "líderes iluminados": figuras desconhecidas que, da noite para o dia, se tornam personagens de grande poder dentro das estruturas de administração paralela, em vários campos da atividade humana. É precisamente esse fenômeno que levou ao poder Vladimir Lenin e Leon Trotsky: ambos eram líderes do governo paralelo dos sovietes, que subitamente se tornaram chefes de Estado, em um período de poucos meses. Durante estes acontecimentos, muitos indivíduos entre os grupos criminosos podem também se apossar de cargos de influência - este é o caso de Stalin, até então, burocrata muito menos influente do que Trotski no Partido Bolchevique, que tinha tido papel muito mais importante no tráfico de armas e assalto na região do Cáucaso do que teria na Grande Revolução. 

Por fim, o processo subversivo termina na etapa da "normalização": conforme Yuri Bezmenov, a expressão foi originalmente usada por Brezhnev para designar a retomada brutal do poder pelo regime comunista Tcheco, em 1968, após a primavera de Praga. Nesta fase da subversão, os recém-empossados líderes passam a desestimular a agitação social ativamente, por vezes através da eliminação física de grupos usados nas etapas anteriores da estratégia. A China comunista serve de exemplo neste ponto: após a proclamação da República Popular, o cultivo da papoula foi proibido, e inúmeros líderes de grupos bandoleiros - antigos aliados de Mao - foram sistematicamente executados. O Partido Comunista nunca mais expôs seu uso do tráfico de drogas para financiamento de seu aparato, e todas as atividades ligadas ao comércio passaram a ser condenadas como crime. A União Soviética viu processo muito semelhante: grupos anarquistas usados durante o processo revolucionário foram proibidos; todos os partidos políticos de esquerda - com excessão do Partido Bolchevique (ou seja, o próprio Partido Comunista) - foram banidos do país e seus líderes que manifestaram resistência foram mortos ou encarcerados. O movimento "sex-lib", que floresceu durante a revolução, foi massacrado - posteriormente, os homossexuais seriam condenados como criminosos a penas nos campos de trabalho forçado do GULAG, ou seriam fuzilados. Um dos partícipes da insurreição francesa de 1789, Pierre Vergniaud, diria: "A revolução devora seus filhos".

O estudo dos conceitos abordados por Yuri Bezmenov permite ter uma visão da tragédia criada pelo movimento comunista, e, em grande medida, do sofrimento trazido por todos os movimentos revolucionários que a humanidade já viu - talvez nem todos, mas certamente os que são inspirados pela "ideologia", aqui conforme o sentido usado por Eric Voegelin. As doces promessas da revolução, na maioria das vezes, se convertem no amargo sabor da desilusão, da fome, da miséria e da morte. Conhecer a arma usada pelas organizações que pretendem destruir a liberdade é a melhor forma de não se deixar seduzir por uma belíssima propaganda, que é nada além da forma mais letal do canto das sereias. 

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

A nossa moral e a deles

"Razão e justiça controlam a estrela mais remota e solitária. Olhe para aquelas estrelas. Não parecem safiras e diamantes solitários? Bem, você pode imaginar qualquer maluquice botânica e geológica que lhe agrade. Pensar em florestas de adamantino com folhas de brilhantes. Pensar  que a lua é uma lua azul, uma enorme safira solitária. Mas não acredite que essa astronomia fanática possa fazer a mínima diferença para a razão e a justiça de conduta. Em planícies de opala, abaixo de penhascos cunhados em pérola, você ainda encontraria um aviso no mural: 'Não roubarás'"

De G.K. Chesterton, em A Inocência do Padre Brown.


Uma das mais elementares diferenças entre o movimento revolucionário, nas suas diversas vertentes, e o ponto de vista conservador é a crença na existência de valores morais eternos e universais, por parte deste. Para o conservador, a justiça, a decência, o respeito cedido à liberdade e à vida alheias, bem como os conceitos de bem e mal, todos são valores eternos, válidos para todos os seres humanos. As leis que valem para um devem valer para o outro, não importando a que se atribuem as ações de quem quer que seja. Se alguém comete um ato criminoso, o mesmo não se torna menos criminoso em razão do que o agente diga que é seu motivo. Para o revolucionário, a coisa é um pouco diferente.


O bom comunista deve estar disposto a defender o terror político, o assassinato, o roubo e o genocídio em nome da causa. Não é a minha opinião, é a de Marx, Engels, Trotsky, Lenin e Stalin. Basta ler os textos dos mesmos que já são amplamente conhecidos pelo público em geral para constatar este fato. O jornal Neue Rheinische Zeitung, de Marx e Engels, dá testemunho disto. Trotsky é ainda mais explícito, em Nossa moral e a deles e em Terrorismo e comunismo. Ele dizia: "Ser contra o terror político, por princípio, é ser contra o governo do proletariado".

O bom conservador respeita as leis, mesmo que isso seja prejudicial à sua causa. A própria origem do termo tem sua raiz em comum com a equivalente médica, a contraposição entre o tratamento radical e o tratamento conservador. Enquanto o tratamento radical admite amputações e intervenções agressivas (muitas vezes desastrosas), o tratamento conservador procura as soluções menos danosas para o paciente. É uma questão de jogar a água fora, sem se livrar simultaneamente da criança. Para o revolucionário, a criança pode ser descartada com o resto - ainda que ele diga, por mais estúpido que pareça, que o faz em nome da criança.

A moral e a religião são atacadas pelo revolucionário pela mesma razão. Para que seja alcançada a sociedade perfeita, dizem eles, pode ser necessário ignorar estes detalhes. Matar ou não matar? Porque não? Afinal, é em nome de um bem maior. O conservador é da opinião que dita que, a partir do momento em que se abandonam estes valores, simplesmente não será possível alcançar uma sociedade perfeita - porque não se pode chamar de perfeita uma civilização de terror, covas coletivas, do Gulag, de censura à toda e qualquer opinião contrária ao governo, de um povo posto à força de joelhos diante de governantes "iluminados", ainda que tudo isto seja em nome de maravilhas como uma sociedade sem classes, ou uma sociedade composta por seres humanos cuidadosamente selecionados com base em supostas melhorias físicas ou uma sociedade regida pela mais perfeita razão cartesiana. Até porque, até onde dita o senso comum, os escravos do Gulag também são escravos, e os homens do governo são senhores, ou não? Parece que é assim. E me parece que a "raça superior" do nacional-socialismo perdeu a guerra contra as supostas "raças mais fracas", ou não? Também parece que sim. Além de tudo, me parece que os revolucionários franceses depuseram um rei para colocar em seu lugar um imperador (diga-se de passagem, com muito mais poderes que o rei). Corrijam-me se eu estiver equivocado.

Um líder conservador sempre preza pelos valores universais, pela justiça divina e pela razão obtida pela experiência das gerações anteriores, que ele respeita e não tenta amputar da experiência de seu tempo. Desde César, sabe-se que um governo com poderes excessivos tende a ser tirânico. Washington, por exemplo, sabia disso. Ele também sabia ser mais prudente não se aliar aos revolucionários franceses, que ele logo percebeu serem muito dispostos à conspiração, a mentiras e a todo tipo de expediente maligno em nome das "elevadas causas". O primeiro presidente dos Estados Unidos manteve firmemente a posição de não enviar auxílio militar à França de Robespierre, e sempre zelou pela paz até mesmo com o antigo nêmesis das colônias, o Império Britânico, ainda que este oferecesse risco à liberdade das colônias. A manobra permitiu aos Estados Unidos, nas décadas após a morte de Washington, manter boas relações com o país e até mesmo conseguir uma expansão significativa para o oeste. Os revolucionários franceses acreditavam na diplomacia da guilhotina. Foram todos guilhotinados. O conservador Washington acreditava na diplomacia do bom senso.

Sua carta de despedida para o povo americano, ao fim de seu governo, dá testemunho imortal do grande homem que foi e de sua sabedoria. Ainda vale, até para os brasileiros:

"A religião e a moral são condições necessárias para a prosperidade dos Estados. Seria em vão acreditar no patriotismo daquele que quiser destruir estas duas colunas do edifício social. Ambos, políticos e homens de fé, devem reverenciá-las e preservá-las. Um volume não bastaria para traçar as relações que elas têm com a felicidade pública e particular
...
Observai, diante de todas as nações, as regras da justiça  e da boa fé, para viver em paz com elas. A religião e a moral fazem disso uma lei e a política sóbria as imita. É digno de um povo esclarecido e livre, que em breve será um grande povo, dar ao universo um exemplo tão sublime quanto novo, mostrando-se constantemente movido pela justiça e pela boa vontade".

Washington terminou seu governo e se recusou a concorrer a um terceiro mandato, sabendo que abriria precedentes para governos ditatoriais. Ele sabia que a única garantia de liberdade é um governo de poderes limitados. Ele também sabia que os valores morais são eternos e universais, e sabia que  abandoná-los é abandonar também as supostas "causas elevadas".

Em 1797, George Washington, um conservador temente a Deus, já sabia muito bem destas coisas. Os políticos de hoje se esqueceram de tudo. Precisa-se urgentemente de mais homens como ele, em todos os governos do planeta.

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