segunda-feira, 28 de novembro de 2016

A grande mídia e Fidel Castro

A classe jornalística se recusa a chamar Castro por seu nome – seria uma dor terrível confessar que o ídolo máximo não passa de um homicida, um ladrão, um criminoso muito mais nojento que um vigarista comum. A hesitação dos âncoras chega a ser cômica – “grande legado”, “grande homem”, “um dos homens mais importantes do século XX”. Castro foi todas essas coisas – deixou um “grande legado”, como a peste bubônica deixou, foi um “grande homem”, como Calígula. Foi (por que não?) importante: tanto quanto o Krakatoa ou como a Grande Fome irlandesa. O amor e a hesitação dos queridos periodistas vem das escolas de Comunicação, onde aprendem, conflituosamente, a idolatrar, a cada dia, assassinos em massa, e a papagaiar sobre a universalidade e necessidade incontestável do império dos direitos humanos – desde que, evidentemente, esses direitos se apliquem tão somente aos mais brilhantes filhos do movimento revolucionário. Os “inimigos de classe”, naturalmente, podem mofar na UMAP. Não fazer as chamadas e os comentários do dia sobre tão gentil figura com alguma confusão interior secreta é impossível.

Os companheiros fazem as caras e bocas mais divertidas imagináveis – as palavras saem aos tropeços. Alguns demonstram vontade de dizer os pontos e as vírgulas, mas a vontade é tão passageira e fraca como  caráter do exemplar mediano da categoria. Quando um entrevistado decide colocar os pingos nos “is”, aí a expressão é de terror sincero – escândalo, blasfêmia. Quem ousaria denunciar um “humanista”? Quem atacaria de forma tão vil, baixa e caluniosa “o melhor dos filhos da América Latina”? Só um fascista, evidentemente. O problema está nas situações onde é um “companheiro” quem entrega o jogo, um ex-guerrilheiro, um militante do partido – o horror cósmico da situação explica o ódio mortal de uma das castas de comunistas pelos trotskistas (abominações entre as abominações).

Quando um cubano decide pontuar, aí mesmo é que nosso prezado companheiro entra em desespero, em choro e ranger de dentes – interno, o que é natural, o bom jornalista é tão cínico e teatral quanto o mais sanguinolento dos psicopatas. O cubano que fala mais do que deve precisa ser excluído, calado, “desaparecido”. É uma “não pessoa”. É um inimigo de classe – por que diabos não ficou para enfrentar a justiça histórica sob a justiça implacável do partido da vanguarda do proletariado? Com o inimigo de classe, não há diálogo possível – “se o inimigo resistir, ele deve ser exterminado”, dizia o camarada Lênin. O dissidente deve ser removido da existência e sua voz nunca mais deve ser ouvida pelos grandes meios de comunicação – Carlos Moore desapareceu, e Pandura talvez venha a segui-lo, a depender de sua capacidade de “autocrítica”.

Se alguém tem dúvida a respeito do caráter patológico da ideologia dominante nos cursos de ciências humanas – e na temível tendência observada principalmente entre jornalistas, advogados e membros da alta administração de grandes empresas – é por razões que fogem à compreensão humana. A dupla medida é óbvia. O desvio moral é aberrante e faz estardalhaço. O medo – ideológico, oportunista ou simplesmente cretino – da expressão correta, ou das expressões corretas, é mais claro que o Sol. “Assassino”, “Ditador” são termos que jamais serão pronunciados. Dizê-los é um esforço além da mediocridade excepcional dos companheiros, e é um ato que destrói toda uma forma de educar escritores e formadores de opinião – é a destruição, justa e necessária, do modelo deformado do que se convencionou chamar de “jornalista”, no Brasil.

Mais sobre o tema - Carlos Moore discute o racismo e a perseguição étnica praticada pelo regime comunista cubano:

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